DA DIREÇÃO
O ano de 2023 trouxe importantes desenvolvimentos a nível regulatório e legislativo que reforçam o compromisso, tanto a nível europeu como nacional, de assumir um papel de liderança no que se refere à transição energética e neutralidade carbónica. A nível europeu, destacam-se as várias iniciativas no âmbito do pacote legislativo REPowerEU, cujos objetivos se prendem com a redução da dependência de tecnologias poluentes para produção de electricidade com vista a um sistema energético resiliente e integralmente sustentável. O lançamento da consulta pública ao Net-Zero Industry Act (NZIA) e a publicação da terceira versão da Diretiva das Renováveis (RED III), são exemplos emblemáticos dessas iniciativas. A nível nacional, destaca-se a submissão da revisão ao Plano Nacional de Energia e Clima 2030 à Comissão Europeia, com um transversal aumento de ambição face à edição original e da publicação do DecretoLei n.º 11/2023, que procede à simplificação dos processos de licenciamento ambiental, originalmente anunciados em 2022.
A presente edição do anuário, tal como nos anos anteriores, explora os principais dados e indicadores de geração e produtibilidade do setor elétrico renovável, incluindo análises de foro ambiental e macroeconómico, bem como aponta as mais relevantes novidades e alterações legislativas incluindo o portefólio de todos os centros electroprodutores renováveis dos nossos Associados. Apresentamos também a relevância dos Associados cujos projetos se encontram ainda na fase de desenvolvimento, incluindo uma secção dedicada à potência a instalar por tecnologia.
Em 2023, a APREN contou com um total de 201 Associados, repartidos pelas categorias de Produtores (74 Associados) e Serviços e indústria (125 Associados). Em termos de representatividade nacional, a APREN representa 86% do setor da produção de eletricidade renovável em Portugal, que se traduz por uma quota de 99% da potência instalada eólica, 89% da pequena hídrica, 87% das grandes centrais hídricas, 60% da solar fotovoltaica, 45% da biomassa e 100% da geotermia.
Considerando as centrais de produção de eletricidade a partir de fontes renováveis, o Anuário 2024 apresenta: 11 centrais a biomassa (387 MW), 244 centrais eólicas (5 773 MW), 46 grandes centrais hídricas (6 737 MW), 94 pequenas centrais hídricas (369 MW), 95 centrais solares fotovoltaicas (1 188 MW) e 3 centrais geotérmicas (33 MW). Estes dados correspondem a um total de 493 centrais renováveis com uma potência de 14 487 MW.
Seguindo a normalização definida pela Diretiva (UE) 2018/2001, relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis, o consumo final de eletricidade nacional resultante de energias renováveis representou 62,0%¹ do total. Tendo isto em conta, verificouse um ano médio de produtibilidade eólica, que registou um índice de eolicidade de 0,99, no entanto, contrariamente ao verificado no ano anterior, a produção hídrica retomou com relativa força tendo em conta a continuidade do estado de seca severa no território nacional, verificando um índice de hidraulicidade de 0,99. O índice de solaridade apresentou em 2023 o valor de 1,01.
Os dados referentes à produção de eletricidade a partir de fontes renováveis indicam uma contribuição de: 11,9 TWh da hídrica mais 2,8 TWh de produção em bombagem, 13,1 TWh da eólica, 2,9 TWh das da bioenergia, 0,18 TWh da geotermia e 3,6 TWh da fotovoltaica à qual se somam 1,7 TWh gerados em regime de autoconsumo. Em relação às centrais de geração de eletricidade a partir de combustíveis fósseis, destacam-se, negativamente, o gás natural com 8,1 TWh, as centrais de cogeração fóssil que contribuíram com 2,1 TWh e as centrais a fuel e gasóleo com 1,1 TWh.
No ano 2023, verificou-se uma redução de 47,4% no preço horário médio da eletricidade no mercado grossista Ibérico, consolidando e realçando que o setor da eletricidade renovável teve e continuará a ter um papel fundamental enquanto seguro de proteção para o consumidor contra uma eventual abrupta subida de preços de eletricidade, uma vez que a produção de eletricidade com tarifa garantida continuou a providenciar um benefício económico para o sistema, gerando um sobre ganho para o SEN e, consequentemente, uma poupança para todas as tipologias de consumidores de eletricidade. Todos estes fatores, evidenciam a importância da eletricidade renovável para a sociedade, economia e ambiente, sendo de destacar ainda os seguintes factos:
• Uma poupança em importações de gás natural de
1 950 M€ correspondente a uma redução de 61,4% face
ao valor verificado no ano 2022;
• 9,7 Mt de emissões de CO2 equivalente evitadas;
• 750 M€ em licenças de emissão de CO2 evitadas;
• 626 M€ poupados em eletricidade importada;
• Uma poupança acumulada de 7 014 M€ induzida pelo
efeito da Ordem de Mérito das renováveis no mercado
ibérico.
A análise dos dados acima mencionados, em concreto a poupança em importações de gás natural, deve sempre ter em conta a particularidade de 2022 ter ficado marcado pela guerra na Ucrânia, e o aumento do preço do gás natural devido às sanções por parte da União Europeia, que teve repercussões bem vincadas e visíveis no setor elétrico. Verificou-se um ligeiro aumento no consumo de eletricidade de 0,3% (50 382 GWh em 2022 para 50 523 GWh em 2023), o que parece estar associado a um aumento da eletrificação dos consumos de energia. Observou-se um aumento da incorporação renovável, em termos de produção de eletricidade, destacado pelo retomar do contributo positivo da tecnologia hídrica, dado ao aumento da pluviosidade em território nacional ao longo do ano 2023.
Entrando em maior detalhe nos importantes desenvolvimentos legislativos a nível europeu, o ano de 2023 ficou marcado por duas importantes peças: o Net-Zero Industry Act e a mais recente revisão da Renewable Energy Directive (RED III); a primeira, publicada a março de 2023, faz parte do pilar industrial do Green Deal, visando a criação de um ecossistema regulatório previsível e simples, potenciando a capacidade de produção de bens e serviços que são fundamentais para cumprir os objetivos de neutralidade carbónica europeus. A aceleração no desenvolvimento e implementação de tecnologias net-zero tem como objetivo a redução do risco associado à substituição de aproveitamentos fósseis russos por outras dependências estratégicas que possam prejudicar o desenvolvimento socioeconómico dentro do espaço da União Europeia. Por outro lado, a mais recente revisão da Diretiva das Energias Renováveis (RED III) confirma o reforço na ambição formalizada pela União Europeia em tornar a Europa numa zona climaticamente neutra até 2050. As renovadas metas vinculativas que constam da peça legislativa publicada em abril de 2023 são as seguintes: 42,5% de incorporação renovável no consumo final de energia para 2030, com um complemento indicativo adicional de 2,5% que permitirá atingir os 45% para qual todos os EstadosMembros deverão contribuir. De modo a trilhar um caminho positivo para o cumprimento das metas propostas, a diretiva incorpora uma série de objetivos, tais como:
• Integração de energia renovável nos edifícios;
• Levantamento das zonas necessárias ao cumprimento das
metas 2030;
• Definição das zonas de aceleração de implementação de
energias renováveis;
• Maior participação pública;
• Definição das zonas para infraestruturas de rede e de
armazenamento;
• Simplificação dos procedimentos de concessão de licenças;
• Adequação dos recursos operacionais e financeiros das
autoridades competentes pelos processos de licenciamento;
• Fixação de um objetivo indicativo para tecnologias
inovadoras de energias renováveis de pelo menos 5 % da
nova capacidade de energias renováveis instalada até 2030;
• Classificação de projetos de energia renovável enquanto
projetos de interesse público superior.
A nível nacional, destaca-se a revisão do Plano Nacional de Energia e Clima 2030 (PNEC 2030), que transpõem em legislação nacional o aumento de ambição formalizado na RED III. Adicionalmente, é de referir a simplificação dos processos de licenciamento ambiental no âmbito do novo pacote de medidas do SIMPLEX, formalizado legislativamente através da publicação do Decreto-lei n. º11/2023 e que efetivamente eliminou situações em que seria necessária uma análise casoa-caso, a redefinição de limiares que sujeitam os projetos à necessidade de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA), e a eliminação de AIA para a produção de hidrogénio verde
Em junho de 2022, os governos de Portugal e Espanha criaram o mecanismo ibérico de limitação do preço do gás natural para a formação do preço de eletricidade produzido por centrais de ciclo combinado a gás natural. O chamado “cap ao gás” estabeleceu um limite de 40 €/MWh ao preço do gás natural para produção de eletricidade. Dada à redução de preços no mercado grossista mencionada anteriormente, o referido mecanismo perdeu o seu propósito, não sendo renovado para o presente ano. Não obstante, contribuiu com uma poupança 4,78 mil milhões de euros acumulada, estando repartida em 4,1 mil milhões de euros em 2022 e os restantes 680 milhões de euros em 2023. Olhando para as contribuições do setor renovável para o sobreganho do Sistema Elétrico Nacional, destaca-se a eólica, a assegurar um benefício económico total de 1,65 mil milhões de euros, estando desagregado em 51,9 milhões de euros em 2022 e 1,59 mil milhões de euros em 2023.
Todos estes avanços na legislação nacional foram conseguidos devido ao espírito de colaboração e cooperação com todas as entidades envolvidas na condução deste setor, com especial destaque para: o Ministério do Ambiente e Ação Climática, Ministério das Finanças, Ministério da Economia e do Mar, Ministério das Infraestruturas e respetivas Secretarias de Estado, DGEG, APA, REN, E-Redes, SU Universal, ERSE, ENSE, as CCDRs, o ICNF, LNEG, DGPC, ARSs e as Câmaras Municipais. Todavia, não posso deixar de agradecer a todos estes atores pela estreita interação que têm mantido com a APREN, referindo que a porta da Associação estará sempre aberta a todas elas para dar continuidade ao diálogo e debate aberto rumo à descarbonização.
Concluo com uma nota pessoal. É com orgulho que vi a Associação continuar a crescer, quer em termos de Associados, quer em número colaboradores (aos quais muito agradeço pelo trabalho que têm vindo a desenvolver e sem os quais os resultados alcançados não seriam exequíveis) ao longo do meu quinto ano de mandato, tendo reforçado, claramente, a minha convicção da crescente e incontornável importância do setor da eletricidade renovável em Portugal e na Europa, porque: